Estou certo de que poucos de vocês irão discordar da afirmação de Stephen King ser um dos grandes mestres do terror contemporâneo. Sua escrita é capaz de acertar em cheio o coração dos leitores com uma mira afiadíssima, provocando muitas vezes uma hemorragia nos sentimentos de esperança e bondade de quem lê suas obras.
Caso você tenha vindo pelo título sensacionalista, confesso, fique tranquilo, trata-se apenas de uma figura de linguagem, King não foi de fato baleado e passa bem em seus 73 anos.
Porém, mesmo os grandes mestres, e King não é uma exceção, podem escorregar. Este é o caso em “A Bala de Prata ou A Hora do Lobisomem”: o autor norte americano perdeu a mão e, ao invés de acertar o leitor, se viu em um beco sem saída e terminou “baleado” pelas próprias armadilhas da narrativa.
Muitos spoilers adiante! Não aceitamos reclamações!
Com o nome original muito mais interessante do que a pobre imaginação de quem o traduziu, “Cycle of the Werewolf” é uma novela curta lançada em 1983 e que conta com ilustrações de Bernie Wrightson.
Nela, King inicia cenas de violência e desespero sem qualquer introdução ou delongas. Uma fera, a cada lua cheia, escolhe suas vítimas de forma quase aleatória e as devora em cenas de impiedosa e nefanda sanguinolência.
A pequena cidade de nome saxão, o qual jamais me lembrei e que tão pouco é relevante, se vê boiando às natas do desespero, quando, mês após mês, alguns de seus cidadãos são encontrados dilacerados, esquartejados, obliterados e mais qualquer outro adjetivo que caiba bem em um filme de Tarantino.
Apesar das cenas de terror funcionarem muito bem em seus objetivos de provocar medo e pânico, a trama criada por King deixa a desejar sob diversos pontos de vista.
Após meses de ataque, ninguém suspeita de quem pode ser o lobisomem, quando um menino de 12 anos, cadeirante, testemunha um dos ataques, ficando de frente com a fera.
Em uma solução nem um pouco crível, mesmo para uma sociedade com cultura bélica enraizada, o tio desse jovem lhe entrega um revólver e uma bala de prata, simplesmente porque o menino pediu.
Após certo conflito com a besta, o jovem leva a melhor, e revela-se que a fera era o reverendo da cidade.
Você não viu nada de mais? Eu também não. E esse é um dos maiores problemas dessa novela. Parece haver nela uma intrincada teia que irá construir conclusões horripilantes, como as cenas de ataque do lobisomem. No entanto, a decepção é livre.
King apela para preceitos como o menino fragilizado por uma condição física, umas pequenas pistas colocadas ao longo dos capítulos, uma grande revelação (risos), uma figura emblemática da sociedade local como o criminoso.
No fim das contas, o que temos são soluções ex-machina em uma cadente espiral de fórmulas dramáticas que denunciam um vórtice dramático vazio de conteúdo ou relevância.
É… dessa vez, o caçador foi um alvo fácil na mira da narrativa.
Recomendado: NÃO!