Assim como os experimentos de Herbert West, estamos de volta, desta vez para concluir o que foi iniciado na primeira parte. Novamente gostaria de sugerir o uso de fones de ouvido para a mais completa imersão nos horrores sonoros influenciados pela obra de H. P. Lovecraft.
Contrariando o óbvio, começamos com uma menção não sonora. No ano de 1985, a banda Iron Maiden lançou um álbum duplo ao vivo — Live After Death —, que, embora não apresente nenhuma música mencionando o escritor de Providence, tem na arte da capa a mascote Eddie saindo de seu túmulo no qual é possível ler “That is not dead which can eternal lie. And with strange aeons even death may die” na lápide.
Em 1988 a banda de thrash metal Mekong Delta lançou o disco “The Music of Erich Zann” inspirado na obra homônima. Destaco aqui “Confession of Madness”, uma faixa rápida e vigorosa. No mesmo ano, o Blue Öyster Cult lança o disco “Imaginos” com diversas referências ligeiramente inspiradas na obra de Lovecraft, como por exemplo a canção “I Am The One You Warned Me Of” que cita “Starry Wisdom” uma referência à Igreja da Sabedoria Estelar (Church of Starry Wisdom) presente no conto The Haunter Of The Dark. Além disso, diversos outros elementos vagamente inspirados em Lovecraft podem ser encontrados no disco.
No álbum “Scumdogs Of The Universe” de 1990, o Gwar lança “Horror of Yig”. Para os não familiarizados, Gwar é uma banda altamente performática — com direito a maquiagem, fantasias e efeitos de filmes B — composta por ‘piratas alienígenas’ que vivem na Terra, tendo nos shows narrativas que beiram o terror, a fantasia e o sci-fi. Yig, na mitologia de Lovecraft, é uma deidade conhecida como “Pai das Serpentes” e sua primeira aparição ocorreu no conto The Curse of Yig.
Em 1992, o Therion, ainda na fase death metal lança “Cthulhu” (Beyond Sanctorum, 1992). Doze anos depois a banda voltaria a homenagear H. P. Lovecraft em “Call of Dagon” (Sirius B, 2004) já numa fase mais symphonic/operatic metal.
Uma outra banda com muitas referências ao pai de Cthulhu em sua discografia é “The Darkest of The Hillside Thickets”. Dentre o conteúdo dos diversos álbuns (The Dukes of Alhazred, Great Old Ones, Cthulhu Strikes Back, etc.) destaco aqui a divertidíssima faixa “Goin’ Down To Dunwich” (Cthulhu Strikes Back, 1995) que mistura horror com punk rock.
Chegando quase ao fim da década, a banda americana de brutal/technical death metal Nile lança o disco Among the Catacombs of Nephren-Ka em 1998, em clara referência ao “Faraó Negro” Nyarlathotep.
Já em 2000, o Cradle of Filth inicia suas homenagens a Lovecraft com a faixa “Cthulhu Dawn” (Midian, 2000). A banda voltaria às temáticas ‘cthulianas’ em 2004 com “Mother of Abominations” (Nymphetamine, 2004). A banda inglesa, que mescla temas de horror com diversos estilos góticos e mais voltados ao symphonic black metal, em breve deverá ser dissecada nessa coluna.
Em 2003, a banda de melodic death metal Black Dahlia Murder lança “Thy Horror Cosmic” (Unhallowed, 2003) citando os “horrores abismais” e “Grande Antigo, eu clamo por seu retorno” em referência a Cthulhu. No mesmo ano, surge o grupo eletrônico Musica Cthulhiana com sons ambientes aterrorizantes e altamente imersivos. Outra opção mais voltada ao new age é o disco Legacy of Cthulhu de 2010, do grupo Arkham Inmate.
Em 2005, a banda de power metal espanhola Dark Moor lança a faixa “The Silver Key” (Beyond the Sea, 2005) — precedida pela instrumental “Through the Gates of the Silver Key” — inspirada no conto homônimo de Lovecraft. No mesmo ano a banda de gothic metal alemã The Vision Bleak lança o disco “Carphathia — A Dramatic Poem” que contém a faixa “Dreams in the Witch-House” também inspirada em história de mesmo título do autor.
Além de todas as faixas mencionadas anteriormente — seja na primeira parte ou nessa —, destaco mais algumas que comprovam que Cthulhu é a maior inspiração quando se trata de músicas baseadas na obra de Lovecraft. Seja com o symphonic/epic black metal do Bal-Sagoth em “Shackled to the Trilithon of Kutulu” (The Chthonic Chronicles, 2006), com o punk rock — numa pegada bem Misfits — do Zombeast em “Cthulhu” (Zombeast, 2006), com o death metal do Death Breath na maravilhosa canção instrumental “Cthulhu Fhtagn!” (Stinking up the Night, 2006) ou com o power/thrash metal do Iced Earth em “Cthulhu” (Plagues of Babylon, 2014) fica bem claro que, ao menos entre os terráqueos, o Senhor de R’lyeh é muito mais popular que Azathoth ou Shub-Nigurath.
No entanto, em 2007, a banda de progressive metal Dream Theater lança “Dark Eternal Night” (Systematic Chaos, 2007), bastante inspirada em Nyarlathotep, chegando a emprestar várias frases do conto original. Ainda em um ambiente progressivo, os suecos do Opeth também apresentaram sua homenagem a Lovecraft com uma bela canção chamada “Pyre” (Heritage, 2011) inspirada no conto Beyond The Wall Of Sleep.
A banda de heavy/doom metal Arkham Witch conta com diversas referências a Lovecraft ao longo de sua discografia, destaco aqui “The Haunter of the Dark” do disco I Am Providence (2015), mas indico ao leitor também os discos On Crom’s Mountain (2011) e Legions of the Deep (2012).
Outra bruxa do doom, a Mountain Witch lançou em 2016 “At The Mountains of Madness” (Burning Village, 2016), uma faixa na pegada dos anos 70, característica do estilo stoner/doom metal, com um clima bastante interessante.
Já em Curitiba – terra deste que vos fala –, a banda de death metal Evil Project lança a faixa “Cultist Lullaby” em seu primeiro álbum Return of the Dead (2018). A letra traz o ponto de vista do próprio Cthulhu que, ao acordar, revela suas intenções maléficas para com os humanos.
E se no começo desta lista figurava uma banda batizada com o nome do Pai do Panteão Caótico, encerrarei de forma parecida — ou quase. A banda de post-black metal The Great Old Ones tem toda a sua obra inspirada nos Antigos. Destaco aqui a poderosíssima faixa “Nyarlathotep” do álbum Cosmicism de 2019, mas deixo claro que todos os discos da banda são quase que obrigatórios para os fãs de Lovecraft e de metal extremo.
Nossa jornada no tema se iniciou em 1967 e, por ora, termina em 2019. Ao todo são mais de quatro horas de música, divididas em 50 canções provenientes de seis décadas diferentes. As canções aqui listadas são de climas, andamentos e pesos diferentes, e passei bastante tempo ouvindo cada uma — e todas elas — com carinho. Várias delas já estavam presentes em minhas playlists desde muito tempo, algumas tive a oportunidade de reencontrar e outras ainda são de bandas que tive o prazer de descobrir durante a pesquisa. No entanto, o intuito geral não é, de forma alguma, apresentar as melhores ou as piores, pois isso eu deixo a cargo do leitor/ouvinte. Meu único objetivo foi abranger o máximo de estilos possíveis para apresentar as mais diferenciadas obras. Vale lembrar que, apesar de tudo, essa lista pode nunca ter um fim.