A Musica De H. P. Lovecraft – Parte I

A música de H. P. Lovecraft – Parte I

Músicas para evocar deuses exteriores e outros horrores cósmicos

Indo muito além das páginas das revistas pulp, os tentáculos de Cthulhu, a fertilidade perversa de Shub-Nigurath, ou o caos de Nyarlathotep já invadiram quadrinhos, telas de cinema, televisores, e composições musicais. E se a influência de H. P. Lovecraft, ao longo do tempo, atingiu mídias tão diversas é simplesmente pelo motivo de que sua obra está mais viva do que nunca.

Longe de querer — ou tentar — encontrar todas as canções inspiradas no autor, faço aqui uma lista — não tão breve, mas dividida em duas partes — que visa abranger o máximo de diversidade sonora possível, com várias bandas e artistas que em logo ganharão capítulos próprios nas páginas dessa coluna.

Deixo mais um aviso aos leitores para que tenham cuidado ao explorar a insanidade sonora das faixas listadas, pois os horrores aqui dispostos são extremamente viciantes, em especial se apreciados com fones de ouvido e longe de quaisquer outros afazeres que possam tirar a atenção. Sendo assim, comecemos.

Muito provavelmente a primeira menção ao escritor veio de uma banda chamada exatamente de H. P. Lovecraft, formada em 1967 em Chicago. A banda, que mesclava sons psicodélicos e música folk, tem diversas faixas com menções à obra, além de canções populares. Lançaram dois álbuns intitulados como I e II. Destaco as faixas “The White Ship” (H. P. Lovecraft I, 1967) e “At the Mountains of Madness” (H. P. Lovecraft II, 1968), ambas em referência aos contos homônimos (“O navio branco” e “Nas montanhas da loucura”).

É ainda em 1969, bem longe da era do metal extremo (o estilo mais influenciado pelo autor nos dias de hoje), que surge uma das canções mais macabras: “Azathoth” (Arzachel, 1969), da banda Arzachel, que se passaria facilmente por um cântico religioso tocado em qualquer igreja do mundo, pois tem órgãos, linhas vocais que acompanham o ritmo e, claro, trechos em latim, o que deixa tudo ainda mais bizarro. A letra também é bem interessante e cita Azathoth como “O Poderoso/ Centro de confusão / Governante dos mortos sob o mar de nuvens”.

Já no ano seguinte surge uma das principais menções à obra de Lovecraft. Com riffs pesados como nunca antes e vocais graves, o Black Sabbath trouxe “Behind the Wall of Sleep” (Black Sabbath, 1970) em referência ao conto Beyond the Wall of Sleep (“Além da muralha do sono”). Décadas mais tarde, a banda finlandesa Sentenced homenagearia a mesma narrativa com “Beyond the Wall of Sleep” (North From Here, 1993).

Já na década de 1980, o Metallica, que viria a se consagrar como a maior banda de metal da história, lançou “The Call of Ktulu” (Ride the Lightning, 1984). O baixista, Cliff Burton, foi quem apresentou o horror cósmico de Lovecraft para os outros membros e daí surgiu a faixa instrumental de quase nove minutos que é, na minha opinião, uma das canções mais épicas sobre o tema. Apesar de ter a grafia trocada de propósito (de Cthulhu para Ktulu), o vocalista e líder da banda, James Hetfield, afirmou em anos seguintes que a banda se arrependia da mudança. Em 2016, o baterista, Lars Ulrich, justificou que na época a grafia do nome Cthulhu ficaria complicada demais para o público que não fosse familiarizado com Lovecraft¹.

Ainda na conta do Metallica, temos “The Thing That Should Not Be” (A coisa que não deveria ser), do clássico de 1986 “Master of Puppets”. A letra, além de voltar a citar referências a Cthulhu — “Não está morto aquele que eternamente jaz/ Estranhos éons, até a morte poderá morrer” —, também traz menções a Nyarlathotep com “O caos rastejante” e às “Crianças híbridas que observam o mar” do conto The Shadow Over Innsmouth (“A sombra sobre Innsmouth”). A banda ainda trouxe mais duas canções com referências aos Mitos: “All Nightmare Long” (Death Magnetic, 2008) — que tem um videoclipe sensacional — com uma letra que trata sobre os ”Cães de Tindalos”, que apesar de terem sido criados por Frank Belknap Long, no conto The Hounds of Tindalos, foram incorporados aos Mitos, e “Dream No More” (Hardwired… To Self-Destruct, 2016) em clara referência ao famoso Antigo que “dorme sob o mar negro esperando”.

Já em 1987, a banda gótica Fields Of The Nephilim, que retornará num capítulo próprio, lança “Reanimator” (Dawnrazor, 1987) com referência ao conto Herbert West–Reanimator. No ano seguinte “The Watchman” e “Last Exit for the Lost”, ambas do “The Nephilim”, mencionam Cthulhu. As duas últimas se enquadram como duas das minhas faixas preferidas dessa playlist, com climas sombrios e levadas melancólicas que, com a evolução das canções, explodem em tensão.

Em 1990 a banda americana de death metal Deicide lança “Dead by Dawn”(Deicide, 1990) que, apesar de ser uma referência clara ao filme Evil Dead, não pode deixar de ser mencionada como influência indireta dos tentáculos de Lovecraft. De 1991, trago duas bandas que homenagearam o deus-polvo adormecido. A banda de black metal suíça Samael com “Rite of Cthulhu” (Worship Him, 1991), e os suecos do Entombed no álbum “Clandestine” com a faixa “Stranger Aeons”, que tem um videoclipe bem interessante e uma pintura de Cthulhu no verso do disco.

Em 1993, após várias menções anteriores (como vocês podem ler com mais profundidade na coluna Mausoléu dos ruídos [colocar hiperlink vinculado ao nome da coluna] do meu amigo Thássio Capranera), o Morbid Angel lança “Angel of Disease” (Covenant, 1993) citando Shub-Nigurath e Cthulhu.

Já o Mercyful Fate, uma das bandas mais importantes a mesclar heavy metal e terror na história (como veremos em outras postagens), iniciou suas homenagens ao escritor de Providence em 1994. “The Mad Arab” (Time, 1994) é baseada em Abdul Alhazred, o autor do Necronomicon e “Kutulu – The Mad Arab, Part 2” (Into the Unknown, 1996) é mais uma das canções sobre Cthulhu.

Em 1995, a banda alemã de power metal Rage lançou “The Crawling Chaos” (Black in Mind, 1995), uma canção rápida e pesada sobre Nyarlathotep.

Na década seguinte, em 2004, o grupo de neoclassical darkwave/dark ambient Nox Arcana lançou o álbum Necronomicon, que transporta o ouvinte para um ambiente totalmente lovecraftiano. No mesmo ano, a banda de death metal Sanctifier de Natal, no Rio Grande do Norte, lançou “Cthulhu (The Unspeakable)” (Awaked by Impurity Rites, 2004) no primeiro full-lenght da banda. Apesar de estar destacado aqui apenas o primeiro disco, não foi a única menção que o Sanctifier fez à obra de Lovecraft.

Em 2006, o Catacombs, direto do Arizona, lançou o álbum “In the Depths os R’lyeh”, um disco repleto de tensão e carregado por uma atmosfera sombria e pesada, característica do estilo funeral doom metal.

Mais uma banda que virá a ser mencionada nesta coluna futuramente, a Electric Wizard, é conhecida por sua temática sombria e pelo sludge vigoroso. Além do álbum Dopethrone de 2000, que traz em sua temática geral várias menções à obra de Lovecraft, em 2007 a banda lançou “Dunwich” (Witchcult Today, 2007), que faz uma referência ao conto The Dunwich Horror, numa versão onde a cria de Yog-Sothoth consegue de fato realizar seu propósito. Ainda no mesmo ano e falando do mesmo Outer God, a banda australiana Portal lança “13 Globes” (Outré, 2007). A banda já declarou que muitas de suas letras, mesmo citando as entidades cósmicas e inspiradas em Lovecraft, trazem algumas versões que eles mesmos inventaram².

Em 2008 chegamos à Rússia com a banda Evoke Thy Lords que, numa mistura de gothic, doom e death metal, traz “Towards Yuggoth” (Escape the Dreamlands, 2008), uma canção que mescla vocais femininos bem melódicos e vozes masculinas guturais com flautas, sons acústicos, orquestrações e muito peso. E foi sobre mais uma referência de 2008 que eu encontrei a melhor oportunidade para encerrar essa primeira parte: “Lovecraft’s Death” (Communion, 2008), da banda grega de symphonic death metal Septicflesh traz todos os mitos em contato com o autor em sua última hora de vida. É uma peça interessante e, óbvio, bem carregada de referências de todos os períodos criativos do autor, desde os mitos de Cthulhu até as outras histórias.

Playlist:

Videoclipes:

Referências:

[¹] https://www.revolvermag.com/music/metallicas-ride-lightning-8-things-you-didnt-know-track-track

[²] http://lotfpmetal.blogspot.com/2009/02/interview-with-portal.html

https://web.archive.org/web/20131009212649/http:/www.voicesfromthedarkside.de/Interviews/PORTAL–7050.html

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